terça-feira, 25 de agosto de 2009

A MÚSICA DE SÃO PAULO (UMA MEMÓRIA PESSOAL) 5

Meu primeiro show solo foi no Teatro 13 de Maio, ali na Rua do mesmo nome, onde hoje é o Café Piu-Piu. Era um show metido a fantástico, com efeitos de magia e prestidigitação, e uma banda deliciosa denominada AGÊNCIA DE MÁGICOS, com a qual gravei meu segundo disco solo. Nesse teatro já estavam ensaiando os Dzi Croquettes, a genial invenção de Wagner Mello e Lennie Dale, que lançou em nossa terra as bases do que depois desembocaria nos Secos e Molhados: a androginia como ferramenta da arte. O Teatro 13 de Maio nunca mais foi o mesmo, depois do sucesso dos Dzi Croquettes, mais de um ano em cartaz, com casas cheíssimas. Os Secos e Molhados, ainda sem Neyzinho, eu conheci numa casa muito louca chamada Kurtiço Negro, nos baixos da Rua Santo Antonio, da qual, ninguém se lembra, e eu só tenho certeza de que existiu porque tenho fitas raríssimas de shows dessa casa, com Secos, Luli (mais tarde da dupla Luli & Lucina) e o Alfa Centauri, do Edu. Se não fossem esses registros, eu certamente duvidaria de minha sanidade mental.




Tempos loucos, muito loucos: Moracy Do Val esteve em minha casa, e eu lhe mostrei o LP de uma banda americana chamada Grand Funk Railroad, que despontara para o sucesso subitamente, vindo de um anonimato absoluto, com o expediente de aplicar 1.000.000 de dólares na compra de seu próprio disco, chegando ao primeiro lugar na lista dos mais vendidos, e dai em diante vendendo pelo menos mais cinco milhões de dólares, tornando-se sucesso instantâneo. Moracy Do Val fez o mesmo com os Secos e Molhados, aplicando uma grana sentida nos discos do próprio grupo, dando o start necessário ao que foi o maior fenômeno do disco de que o Brasil já teve notícia. Mas o destino tanto dá quanto cobra: nesse mesmo apartamento conheci dois amigos americanos de Lennie Dale, que ficaram fascinados com a idéia de uma banda de rock que só aparecia maquiada, e cujos rostos limpos ninguém jamais conhecia. Chamavam-se Gene e Paul, e não foi sem surpresa que algum tempo depois surgiu uma banda americana chamada KISS, ambos filhos das New York Dolls, que certamente eram a inspiração visual dos Dzi Croquettes.




Negócios, necessidades, mais uma mudança para o Rio de Janeiro, de onde só retornei, dessa vez em definitivo, em 1983, para a montagem do musical BANDAGE! meu e de Miguel Paiva, no Teatro Cultura Artística. Mas minha vida já se prenunciava paulistana, desde o dia em que na Via Dutra, chegando ao Rio de Janeiro, cruzei com o carro do Joelho de Porco. Trocamos telefones ainda em movimento, e mais tarde, quando cheguei ao Rio, me ligaram perguntando como eu poderia ajuda-los a destrinchar as necessidades documentais para que o show se realizasse. Coloquei imediatamente o meu secretario Tim à disposição, o show aconteceu, Tico Terpins ficou imensamente agradecido, pondo sua casa à minha disposição sempre que eu estivesse em são Paulo.




E aí começa a minha permanência cada vez mais constante em São Paulo, até a mudança definitiva para essas plagas. O Rio de Janeiro começava a dar sinais de deterioração, pelo menos em matéria de música e gravadoras. A Odeon ia sair do prédio onde fizera toda a sua vida, onde o melhor que o Brasil produzira em matéria de música havia sido gravado, e as paredes daquele espaço no Edifício São Borja, ali na Rio Branco, em cima do famoso Paisano, estavam impregnadas pela arte de tantos que nos antecederam. Temi pelos resultados, e meus temores se concretizaram: os estúdios novos eram frios, gelados, sem nenhuma vibração artística. Alem disso, a onda mais uma vez havia se direcionado para São Paulo, e a tal ponto que eu, mesmo morando em minha casa no Rio, trabalhava e estava baseado em São Paulo. A amizade com o Tico começou a ser cada vez mais intensa. Na casa que foi de seus pais, ali em frente à porta dos fundos da TV Tupi, vivemos momentos de prazer musical- gastronômico-sexual inesquecíveis, como apenas São Paulo podia nos propiciar. O Joelho de Porco estava em seus estertores, e o Tico resolveu acabar com ele de chofre, ficando em casa curtindo. Curtíamos todos, pois: era divertido demais. Minha carreira pessoal estava em franco declíni problemas pessoais e profissionais se avolumavam, minha fenomenal arrogância dando dezenas de sinais de que não era suficiente para manter-me vivo, e em contato com tanta coisa interessante que acontecia no panorama musical de São Paulo comecei a me perceber insatisfeito, inadequado, incontrolável, a ponto de explodir, e eu sempre explodia. Mudei de gravadora, por incompatibilidade de gênios com os gênios da EMI, fui para a RCA, que era sensivelmente pior do que a anterior comecei a tropeçar em meus próprios pés, e a única coisa que ainda me dava alguma satisfação era gravar coisas interessantes no porta-studio do Tico, com o qual se iniciou o que seria a nossa vida em comum durante os vinte anos seguintes. São Paulo havia se tornado meu refúgio, a casa do Tico meu porto seguro, os novos amigos a minha referência em matéria de arte.




Zé Rodrix

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